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sexta-feira, 18 de setembro de 2015

HIPERTENSÃO ARTERIAL EM FISICULTURISTAS


Hábitos adquiridos pelo homem no decorrer de seu período evolutivo, especialmente nos últimos 5 mil anos, tais como uma alimentação rica em lipídios, sódio, álcool e cafeína, acompanhada do sedentarismo, fumo e stress do dia a dia, vêm contribuindo para o aumento na incidência da hipertensão arterial. Não é a toa que o homem seja o único mamífero que apresenta alterações em seus níveis pressóricos. De acordo com COTRAN; KUMAR e COLLINS (2000), o papel do meio ambiente nesta doença é muito bem ilustrado pela menor incidência de hipertensão em chineses que vivem na China, em comparação com descendentes chineses que moram nos Estados Unidos. Isto é devido entre outros fatores, pela adoção de hábitos contribuintes para a aparição da doença. O desenvolvimento de hipertensão depende da interação entre predisposição genética e fatores ambientais, embora ainda não seja completamente conhecida a forma como estas interações ocorrem.
Cerca de 15 a 20% da população mundial atualmente é hipertensa. Ao mesmo tempo em que raramente apresenta sinais, esta doença vai minando o sistema circulatório de suas vítimas, até que produz efeitos deletérios – e até mortais, como insuficiência cardíaca e derrames cerebrais (AMODEO; LIMA; VAZQUEZ, 1997; RIBEIRO, 1996; FERREIRA; ZANELLA, 2000). Por isso, é chamada de “assassina silenciosa”. No entanto, a hipertensão tem uma grande vantagem sobre outras doenças: seu diagnóstico só depende de uma simples aferição da pressão arterial, muito embora devemos ter o devido cuidado com esse tipo de leitura, pois a pressão considerada “normal” vem sendo constantemente alterada para valores cada vez mais baixos, a ponto de hoje em dia, quase toda a população mundial ser considerada um “paciente”.
Definir valores normais para a pressão arterial não é fácil porque, quanto maior a pressão, maior o risco cardiovascular e menor a sobrevida, não havendo uma linha divisória entre normotensão e hipertensão. A Organização Mundial de Saúde (OMS) define Hipertensão Arterial como uma elevação crônica de uma ou das pressões arteriais, sistólica e diastólica e recomenda que sejam consideradas hipertensas as pessoas com uma ou ambas as pressões elevadas (BENNETT; PLUM, 1997; MORRISON; HARK, 1999). Segundo Reis e Cople (1999), a hipertensão evolui comumente da forma assintomática até a elevação abrupta dos níveis pressóricos, que apresenta como sinais e sintomas: fadiga, cefaléia occipital, tonturas, zumbidos, queixa de “cabeça pesada”, debilidade, palpitações, angústia e rubor.
No passado era considerado como hipertensa, uma pessoa com valores sistólicos acima de 100 + idade. Após algum tempo, passou a ser considerado hipertenso aquele com pressão arterial acima de 100 + metade da idade, daí a números fixos: 160/100, 140/90 e atualmente 120/90. Como conseqüência, mais e mais pessoas vêm sendo consideradas pacientes mesmo sendo assintomáticas. Desculpem-nos se isso parece cínico, mas essa avaliação parece ser muito conveniente para a indústria farmacêutica.
Esses padrões podem principalmente mal interpretar a situação de pessoas idosas. Nestes indivíduos as artérias tornam-se cada vez mais rígidas, sendo necessária uma maior pressão dentro dos vasos dando a noção de uma pressão arterial mais elevada do que normalmente é. Deve-se ressaltar que a pressão arterial é afetada por uma série de fatores, tais como o estado físico no momento da medição, condição emocional, local de medição, etc; ou seja, a pressão arterial é muito variável.
Se seu médico aferiu a pressão em um braço e disse que sua pressão está elevada, terá ele aferiu o outro braço também? Ou ainda, aferiu a pressão em suas pernas? A pressão arterial pode diferir grandemente de membro para membro, ou seja, a análise de apenas um membro poderá ser apenas parte da história (SINGER, et al, 2005). Como nem todo professor de Educação Física é necessariamente um bom professor, nem todo médico é um bom médico!
Trabalhando com fisiculturistas há vários anos, temos observado uma incidência muito elevada de hipertensão arterial nos mesmos. O peso corporal elevado, proporcionando um maior volume sanguíneo, associado com o uso exacerbado de esteróides anabólicos e outras drogas, tem contribuído demasiadamente para o aumento da ocorrência de hipertensão arterial nesta população.
O coração, sem sombra de dúvida, será o órgão mais afetado, por sofrer uma hipertrofia de adaptação, numa tentativa de continuar bombeando um volume normal de sangue, mesmo com limiares pressóricos aumentados. Outros órgãos também sofrem com a hipertensão, tais como, o cérebro e os rins, cujas alterações são decorrentes de comprometimentos vasculares. Em pacientes hipertensos não-tratados ou ineficazmente controlados, a mortalidade por doença arterial coronariana (DAC) é de 50%, por acidente vascular cerebral (AVC) de 33% e por insuficiência renal de 10 a 15% (REIS; COPLE, 1999; ANDRADE, 2002).
O diâmetro do vaso sanguíneo afeta notavelmente o fluxo sanguíneo. Quando o diâmetro é diminuído (como na aterosclerose), a resistência e a pressão sanguínea aumentam. Ao contrário, quando o diâmetro é aumentado (como em terapia com drogas vasodilatadoras), a resistência diminui e a pressão sanguínea é reduzida. Imaginem uma mangueira dessas usadas para lavar o jardim. Quanto mais você abre a torneira, logicamente mais água sairá e, ao menos que as paredes da mangueira cedam e diminuam a resistência, a pressão que a água irá exercer sobre as paredes da mangueira será cada vez maior. É exatamente isso o que ocorre no organismo.
O organismo procura manter um controle homeostático da pressão sanguínea. Quando esta cai, ocorre uma liberação de norepinefrina pelo sistema nervoso simpático, que aumenta a resistência da parede dos vasos, elevando a pressão. Já os rins controlam o volume de fluído, por meio do sistema renina-angiotensina. Quando os mecanismos regulatórios hesitam, desenvolve-se hipertensão (BENNETT; PLUM, 1997; GUYTON; HALL, 1997; BUSNELLO, 2001).
De maneira mais simples, tem sido proposto o tratamento da seguinte maneira: na hipertensão leve (estágio I) – dieta e exercício (primeira medida); hipertensão moderada (estágio II) e severa (estágio III- o uso da dieta juntamente com o tratamento farmacológico melhora a ação da droga e, em alguns casos, elimina a necessidade ou reduz a quantidade de droga necessária para o controle pressórico). Porém, o melhor tratamento será decido pelo médico em cada caso específico. A seguir, iremos expor algumas dicas relacionadas à alimentação e atividade física para auxiliar no controle e prevenção da hipertensão arterial (RIBEIRO, 1996; WILSON; TEMPLE, 2001; REIS; COPLE, 2002).
A alimentação é, sem dúvida, a primeira conduta a ser adotada no tratamento da hipertensão arterial. O manuseio dietoterápico é o mais importante campo de atuação do tratamento não farmacológico. As terapias sustentadas na alimentação e no estilo de vida, podem diminuir a pressão arterial e evitar a necessidade de tratamento medicamentoso ou de redução das doses necessárias para o controle da pressão arterial, devendo ser adequada às características individuais de cada paciente. Deve-se portanto:
• Evitar alterações abruptas no peso corporal. Portanto, a famosa prática de realizar um off-season exagerado, elevando consideravelmente o peso corporal para depois no período de pre-contest reduzi-lo de maneira drástica, não é aconselhada neste caso;
• Manter uma dieta moderada em lipídios, objetivando o controle da hiperlipoproteinemia. Deve-se controlar também o tipo de lipídios ingeridos, dando preferência para os monoinsaturados e polinsaturados;
• O fracionamento das refeições deve ser aumentado e o volume reduzido para evitar a distensão e o desconforto abdominal, pois estes poderão precipitar um pico hipertensivo;
• Ingerir grande quantidade de líquidos, de preferência fora do horário das grandes refeições;
• Recomenda-se a retirada dos alimentos concentrados em sódio, tais como: enlatados, embutidos, alguns queijos e leites, alimentos industrializados, sucos artificiais, carnes salgadas e defumadas, conservas, aditivos à base de glutamato de sódio, dentre outros, não utilizando sal de adição na hora de servir. Os refrigerantes engarrafados podem ser ricos em sódio, sendo que as bebidas com baixo teor calórico podem possuir um conteúdo ainda maior graças à substituição do açúcar pela sacarina sódica, um adoçante artificial. Temperos prontos devem ser substituídos por ervas naturais, tais como manjericão, alecrim, etc;
• O potássio apresenta um efeito anti-hipertensivo (SHILLS, et al., 2003). Portanto, deve-se manter uma ingestão de potássio adequada, utilizando laranja, bananas, vegetais folhosos verde-escuro, melão, mamão, ameixa, feijão, legumes, leite e carnes frescas são boas fontes de potássio. Porém, deve-se ter cautela no uso de suplementos medicamentosos à base de potássio em pacientes suscetíveis a hiperpotassemia, incluindo aqueles com insuficiência renal, ou em uso de diuréticos poupadores de potássio, inibidores da enzima conversora da angiotensina (ECA), ou bloqueadores de receptores da angiotensina II. Em pacientes com insuficiência renal e em diabéticos, a suplementação com potássio deve ser evitada ou utilizada apenas com extremo cuidado;
• Reduzir ao máximo a ingestão de bebidas alcoólicas e alimentos e/ou bebidas cafeinadas, pois ambos atuam como vasoconstritores;
• Manter um ingestão adequada de magnésio, pois este mineral diminui o tônus e contratilidade vascular (REIS; COPLE, 1999). Os vegetais verdes, legumes, nozes, carnes e cereais integrais são boas fontes desse mineral;
• Estudos epidemiológicos demonstraram que a baixa ingestão de cálcio por meio da dieta está associada ao aumento na prevalência da hipertensão (SHILLS et al., 2003). No caso de dietas que restringem leite e derivados, deve-se realizar uma suplementação deste mineral para garantir uma ingestão adequada do mesmo;
• A suplementação com nutrientes antioxidantes e ômega 3, além de uma ingestão adequada de fibras dietéticas, parecem auxiliar no controle da pressão arterial (SHILLS et al., 2003);
• Pesquisas confirmam que pessoas com maior concentração de vitamina C no plasma sangüíneo apresentam um melhor controle da pressão arterial (MORAN, et al, 1993).
Outros estudos também demonstram claramente que indivíduos praticantes de meditação budista, massagem e outras técnicas de relaxamento também apresentam um melhor controle da pressão arterial. Isto se baseia no fato de que o stress é um poderoso vasoconstritor, sendo inclusive um dos maiores causadores de hipertensão arterial (YEN L-L, et al, 1996).
A atividade física também é muito importante para o controle dos níveis pressóricos. Caso o atleta hipertenso observe uma elevação exagerada na pressão sangüínea durante o treinamento, tal atividade deverá ser interrompida. A elevação aguda da pressão arterial perante o exercício é regulada pelo sistema nervoso simpático, sendo influenciada pelos aumentos da freqüência cardíaca, volume sangüíneo, volume de ejeção e aumento da resistência vascular periférica.
Definitivamente, esta é uma patologia que não deve ser ignorada. Recomendamos fortemente para que todos os fisiculturistas afiram periodicamente sua pressão arterial, além de tomar as medidas preventivas aqui descritas. Para aqueles com o quadro hipertensivo já instalado, os cuidados deverão ser redobrados e o acompanhamento com um cardiologista é de fundamental importância.
Por:
Waldemar Guimarães
E
Rodolfo Peres
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMODEO, C.; LIMA, E. G.; VAZQUEZ, E. C. Hipertensão arterial. São Paulo: Sarvier, 1997.
ANDRADE, J. P. et al. Aspectos epidemiológicos da aderência ao tratamento da hipertensão arterial sistêmica. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, São Paulo, vol.79, n.4, p.375-379, 2002.
BENNETT, J. C.; PLUM, F. Tratado de medicina interna. 20o ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1997.
BUSNELLO, R. G. et al. Características associadas ao abandono do acompanhamento de pacientes hipertensos atendidos em um ambulatório de referência. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, Porto Alegre, vol. 76, n.5, p.349-351, 2001.
COTRAN, R. S.; KUMAR, V.; COLLINS, T. Robbins – Patologia estrutural e funcional. 6º ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2000.
FERREIRA, S. R. G.; ZANELLA, M. T. Epidemiologia da Hipertensão Arterial, Revista Brasileira de Hipertensão arterial, São Paulo, vol. 7, n.2, p. 05-14, abr./jun. 2000.
GUYTON, A. C.; HALL, J. E. Tratado de Fisiologia Médica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1997.
YEN L-L, et al. Comparison of relaxation techniques, routine blood pressure measurements, and self-learning packages in hipertension control. Prev Med 1996; 25: 339-45
MORAN J P, et al. Plasma ascorbic acid concentration relate inversely to blood pressure in human. Am J Clin Nutr 1993; 57:213-17
MORRISON, G.; HARK, L. Medical Nutrition & Disease. 2o ed. Massachusetts: Blackwell Science, 1999.
REIS, N. T.; COPLE, C. S. Nutrição clínica na hipertensão arterial. Rio de Janeiro: Revinter, 1999.
RIBEIRO, A. B. Atualização em Hipertensão arterial. São Paulo: Atheneu, 1996.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE HIPERTENSÃO, III Congresso Brasileiro de Hipertensão Arterial. Campos do Jordão, 2002.
SHILLS, M. E. et al. Tratado de Nutrição Moderna na Saúde e na Doença. 9o ed. Barueri: Manole, 2003.
SINGER, et al. Blood pressure – Assessment of interarm differences. Arch Int Med 1996; 156: 2005-08
WHO. Expert Committee on Hypertension Control, Geneva, p.24-31, oct. 1994.
WILSON, T.; TEMPLE, N. J. Nutritional Health – Strategies for disease prevention. New Jersey: Humana Press, 2001.

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