Páginas

segunda-feira, 29 de julho de 2013

HIPERTENSÃO ARTERIAL EM FISICULTURISTAS


Por Waldemar Marques Guimarães Neto CREF 004810-G/PR e Rodolfo Anthero de Noronha Peres CRN3 16389
Hábitos adquiridos pelo homem no decorrer de seu período evolutivo¸ especialmente nos últimos 5 mil anos¸ tais como uma alimentação rica em lipídios¸ sódio¸ álcool e cafeína¸ acompanhada do sedentarismo¸ fumo e stress do dia a dia¸ vêm contribuindo para o aumento na incidência da hipertensão arterial. Não é a toa que o homem seja oúnico mamífero que apresenta alterações em seus níveis pressóricos. De acordo com COTRAN; KUMAR e COLLINS (2000)¸ o papel do meio ambiente nesta doença é muito bem ilustrado pela menor incidência de hipertensão em chineses que vivem na China¸ em comparação com descendentes chineses que moram nos Estados Unidos. Istoé devido entre outros fatores¸ pela adoção de hábitos contribuintes para a aparição da doença. O desenvolvimento de hipertensão depende da interação entre predisposição genética e fatores ambientais¸ embora ainda não seja completamente conhecida a forma como estas interações ocorrem.

Cerca de 15 a 20% da população mundial atualmente é hipertensa. Ao mesmo tempo em que raramente apresenta sinais¸ esta doença vai minando o sistema circulatório de suas vítimas¸ até que produz efeitos deletérios – e até mortais¸ como insuficiência cardíaca e derrames cerebrais (AMODEO; LIMA; VAZQUEZ¸ 1997; RIBEIRO¸ 1996; FERREIRA; ZANELLA¸ 2000). Por isso¸ é chamada de “assassina silenciosa”. No entanto¸ a hipertensão tem uma grande vantagem sobre outras doenças: seu diagnóstico só depende de uma simples aferição da pressão arterial¸ muito embora devemos ter o devido cuidado com esse tipo de leitura¸ pois a pressão considerada “normal” vem sendo constantemente alterada para valores cada vez mais baixos¸ a ponto de hoje em dia¸ quase toda a população mundial ser considerada um “paciente”.

Definir valores normais para a pressão arterial não é fácil porque¸ quanto maior a pressão¸ maior o risco cardiovascular e menor a sobrevida¸ não havendo uma linha divisória entre normotensão e hipertensão. A Organização Mundial de Saúde (OMS) define Hipertensão Arterial como uma elevação crônica de uma ou das pressões arteriais¸ sistólica e diastólica e recomenda que sejam consideradas hipertensas as pessoas com uma ou ambas as pressões elevadas (BENNETT; PLUM¸ 1997; MORRISON; HARK¸ 1999). Segundo Reis e Cople (1999)¸ a hipertensão evolui comumente da forma assintomática até a elevação abrupta dos níveis pressóricos¸ que apresenta como sinais e sintomas: fadiga¸ cefaléia occipital¸ tonturas¸ zumbidos¸ queixa de “cabeça pesada”¸ debilidade¸ palpitações¸ angústia e rubor.

No passado era considerado como hipertensa¸ uma pessoa com valores sistólicos acima de 100 + idade. Após algum tempo¸ passou a ser considerado hipertenso aquele com pressão arterial acima de 100 + metade da idade¸ daí a números fixos: 160/100¸ 140/90 e
atualmente 120/90. Como conseqüência¸ mais e mais pessoas vêm sendo consideradas pacientes mesmo sendo assintomáticas. Desculpem-nos se isso parece cínico¸ mas essa avaliação parece ser muito conveniente para a indústria farmacêutica.

Esses padrões podem principalmente mal interpretar a situação de pessoas idosas. Nestes indivíduos as artérias tornam-se cada vez mais rígidas¸ sendo necessária uma maior pressão dentro dos vasos dando a noção de uma pressão arterial mais elevada do que normalmente é. Deve-se ressaltar que a pressão arterial é afetada por uma série de fatores¸ tais como o estado físico no momento da medição¸ condição emocional¸ local de medição¸ etc; ou seja¸ a pressão arterial é muito variável.

Se seu médico aferiu a pressão em um braço e disse que sua pressão está elevada¸ terá ele aferiu o outro braço também? Ou ainda¸ aferiu a pressão em suas pernas? A pressão arterial pode diferir grandemente de membro para membro¸ ou seja¸ a análise de apenas um membro poderá ser apenas parte da história (SINGER¸ et al¸ 2005). Como nem todo professor de Educação Física é necessariamente um bom professor¸ nem todo médico é um bom médico!

Trabalhando com fisiculturistas há vários anos¸ temos observado uma incidência muito elevada de hipertensão arterial nos mesmos. O peso corporal elevado¸ proporcionando um maior volume sangüíneo¸ associado com o uso exacerbado de esteróides anabólicos e outras drogas¸ tem contribuído demasiadamente para o aumento da ocorrência de hipertensão arterial nesta população.

O coração¸ sem sombra de dúvida¸ será o órgão mais afetado¸ por sofrer uma hipertrofia de adaptação¸ numa tentativa de continuar bombeando um volume normal de sangue¸ mesmo com limiares pressóricos aumentados. Outros órgãos também sofrem com a hipertensão¸ tais como¸ o cérebro e os rins¸ cujas alterações são decorrentes de comprometimentos vasculares. Em pacientes hipertensos não-tratados ou ineficazmente controlados¸ a mortalidade por doença arterial coronariana (DAC) é de 50%¸ por acidente vascular cerebral (AVC) de 33% e por insuficiência renal de 10 a 15% (REIS; COPLE¸ 1999; ANDRADE¸ 2002).

O diâmetro do vaso sangüíneo afeta notavelmente o fluxo sangüíneo. Quando o diâmetro é diminuído (como na aterosclerose)¸ a resistência e a pressão sangüínea aumentam. Ao contrário¸ quando o diâmetro é aumentado (como em terapia com drogas vasodilatadoras)¸ a resistência diminui e a pressão sangüínea é reduzida. Imaginem uma mangueira dessas usadas para lavar o jardim. Quanto mais você abre a torneira¸ logicamente mais água sairá e¸ ao menos que as paredes da mangueira cedam e diminuam a resistência¸ a pressão que a água irá exercer sobre as paredes da mangueira será cada vez maior. É exatamente isso o que ocorre no organismo.

O organismo procura manter um controle homeostático da pressão sangüínea. Quando esta cai¸ ocorre uma liberação de norepinefrina pelo sistema nervoso simpático¸ que aumenta a resistência da parede dos vasos¸ elevando a pressão. Já os rins controlam o volume de fluído¸ por meio do sistema renina-angiotensina. Quando os mecanismos regulatórios hesitam¸ desenvolve-se hipertensão (BENNETT; PLUM¸ 1997; GUYTON; HALL¸ 1997; BUSNELLO¸ 2001).

De maneira mais simples¸ tem sido proposto o tratamento da seguinte maneira: na hipertensão leve (estágio I) – dieta e exercício (primeira medida); hipertensão moderada (estágio II) e severa (estágio III- o uso da dieta juntamente com o tratamento farmacológico melhora a ação da droga e¸ em alguns casos¸ elimina a necessidade ou reduz a quantidade de droga necessária para o controle pressórico). Porém¸ o melhor tratamento será decido pelo médico em cada caso específico. A seguir¸ iremos expor algumas dicas relacionadas à alimentação e atividade física para auxiliar no controle e prevenção da hipertensão arterial (RIBEIRO¸ 1996; WILSON; TEMPLE¸ 2001; REIS; COPLE¸ 2002).

A alimentação é¸ sem dúvida¸ a primeira conduta a ser adotada no tratamento da hipertensão arterial. O manuseio dietoterápico é o mais importante campo de atuação do tratamento não farmacológico. As terapias sustentadas na alimentação e no estilo de vida¸ podem diminuir a pressão arterial e evitar a necessidade de tratamento medicamentoso ou de redução das doses necessárias para o controle da pressão arterial¸ devendo ser adequada às características individuais de cada paciente. Deve-se portanto:

· Evitar alterações abruptas no peso corporal. Portanto¸ a famosa prática de realizar um off-season exagerado¸ elevando consideravelmente o peso corporal para depois no período de pre-contest reduzi-lo de maneira drástica¸ não é aconselhada neste caso;

· Manter uma dieta moderada em lipídios¸ objetivando o controle da hiperlipoproteinemia. Deve-se controlar também o tipo de lipídios ingeridos¸ dando preferência para os monoinsaturados e polinsaturados;

· O fracionamento das refeições deve ser aumentado e o volume reduzido para evitar a distensão e o desconforto abdominal¸ pois estes poderão precipitar um pico hipertensivo;

· Ingerir grande quantidade de líquidos¸ de preferência fora do horário das grandes refeições;

· Recomenda-se a retirada dos alimentos concentrados em sódio¸ tais como: enlatados¸ embutidos¸ alguns queijos e leites¸ alimentos industrializados¸ sucos artificiais¸ carnes salgadas e defumadas¸ conservas¸ aditivos à base de glutamato de sódio¸ dentre outros¸ não utilizando sal de adição na hora de servir. Os refrigerantes engarrafados podem ser ricos em sódio¸ sendo que as bebidas com baixo teor calórico podem possuir um conteúdo ainda maior graças à substituição do açúcar pela sacarina sódica¸ um adoçante artificial. Temperos prontos devem ser substituídos por ervas naturais¸ tais como manjericão¸ alecrim¸ etc;

· O potássio apresenta um efeito anti-hipertensivo (SHILLS¸ et al.¸ 2003). Portanto¸ deve-se manter uma ingestão de potássio adequada¸ utilizando laranja¸ bananas¸ vegetais folhosos verde-escuro¸ melão¸ mamão¸ ameixa¸ feijão¸ legumes¸ leite e carnes frescas são boas fontes de potássio. Porém¸ deve-se ter cautela no uso de suplementos medicamentosos à base de potássio em pacientes suscetíveis a hiperpotassemia¸ incluindo aqueles com insuficiência renal¸ ou em uso de diuréticos poupadores de potássio¸ inibidores da enzima conversora da angiotensina (ECA)¸ ou bloqueadores de receptores da angiotensina II. Em pacientes com insuficiência renal e em diabéticos¸ a suplementação com potássio deve ser evitada ou utilizada apenas com extremo cuidado;

· Reduzir ao máximo a ingestão de bebidas alcoólicas e alimentos e/ou bebidas cafeinadas¸ pois ambos atuam como vasoconstritores;

· Manter um ingestão adequada de magnésio¸ pois este mineral diminui o tônus e contractilidade vascular (REIS; COPLE¸ 1999). Os vegetais verdes¸ legumes¸ nozes¸ carnes e cereais integrais são boas fontes desse mineral;

· Estudos epidemiológicos demonstraram que a baixa ingestão de cálcio por meio da dieta está associada ao aumento na prevalência da hipertensão (SHILLS et al.¸ 2003). No caso de dietas que restringem leite e derivados¸ deve-se realizar uma suplementação deste mineral para garantir uma ingestão adequada do mesmo;

· A suplementação com nutrientes antioxidantes e ômega 3¸ além de uma ingestão adequada de fibras dietéticas¸ parecem auxiliar no controle da pressão arterial (SHILLS et al.¸ 2003);

· Pesquisas confirmam que pessoas com maior concentração de vitamina C no plasma sangüíneo apresentam um melhor controle da pressão arterial (MORAN¸ et al¸ 1993).

Outros estudos também demonstram claramente que indivíduos praticantes de meditação budista¸ massagem e outras técnicas de relaxamento também apresentam um melhor controle da pressão arterial. Isto se baseia no fato de que o stress é um poderoso vasoconstritor¸ sendo inclusive um dos maiores causadores de hipertensão arterial (YEN L-L¸ et al¸ 1996). A atividade física também é muito importante para o controle dos níveis pressóricos.

Caso o atleta hipertenso observe uma elevação exagerada na pressão sangüínea durante o treinamento¸ tal atividade deverá ser interrompida. A elevação aguda da pressão arterial perante o exercício é regulada pelo sistema nervoso simpático¸ sendo influenciada pelos aumentos da freqüência cardíaca¸ volume sangüíneo¸ volume de ejeção e aumento da resistência vascular periférica. Definitivamente¸ esta é uma patologia que não deve ser ignorada. Recomendamos fortemente para que todos os fisiculturistas afiram periodicamente sua pressão arterial¸ além de tomar as medidas preventivas aqui descritas. Para aqueles com o quadro hipertensivo já instalado¸ os cuidados deverão ser redobrados e o acompanhamento com um cardiologista é de fundamental importância.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS



AMODEO¸ C.; LIMA¸ E. G.; VAZQUEZ¸ E. C. Hipertensão arterial. São Paulo: Sarvier¸ 1997.

ANDRADE¸ J. P. et al. Aspectos epidemiológicos da aderência ao tratamento da hipertensão arterial sistêmica. Arquivos Brasileiros de Cardiologia¸ São Paulo¸ vol.79¸ n.4¸ p.375-379¸ 2002.

BENNETT¸ J. C.; PLUM¸ F. Tratado de medicina interna. 20o ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan¸ 1997.

BUSNELLO¸ R. G. et al. Características associadas ao abandono do acompanhamento de pacientes hipertensos atendidos em um ambulatório de referência. Arquivos Brasileiros de Cardiologia¸ Porto Alegre¸ vol. 76¸ n.5¸ p.349-351¸ 2001.

COTRAN¸ R. S.; KUMAR¸ V.; COLLINS¸ T. Robbins – Patologia estrutural e funcional. 6º ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan¸ 2000.

FERREIRA¸ S. R. G.; ZANELLA¸ M. T. Epidemiologia da Hipertensão Arterial¸ Revista Brasileira de Hipertensão arterial¸ São Paulo¸ vol. 7¸ n.2¸ p. 05-14¸ abr./jun. 2000.

GUYTON¸ A. C.; HALL¸ J. E. Tratado de Fisiologia Médica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan¸ 1997.

YEN L-L¸ et al. Comparison of relaxation techniques¸ routine blood pressure measurements¸ and self-learning packages in hipertension control. Prev Med 1996; 25:339-45

MORAN J P¸ et al. Plasma ascorbic acid concentration relate inversely to blood pressure in human. Am J Clin Nutr 1993; 57:213-17

MORRISON¸ G.; HARK¸ L. Medical Nutrition & Disease. 2o ed. Massachusetts: Blackwell Science¸ 1999.

REIS¸ N. T.; COPLE¸ C. S. Nutrição clínica na hipertensão arterial. Rio de Janeiro: Revinter¸ 1999.

RIBEIRO¸ A. B. Atualização em Hipertensão arterial. São Paulo: Atheneu¸ 1996.

SOCIEDADE BRASILEIRA DE HIPERTENSÃO¸ III Congresso Brasileiro de Hipertensão Arterial. Campos do Jordão¸ 2002.

SHILLS¸ M. E. et al. Tratado de Nutrição Moderna na Saúde e na Doença. 9o ed. Barueri: Manole¸ 2003.

SINGER¸ et al. Blood pressure – Assessment of interarm differences. Arch Int Med 1996; 156: 2005-08

WHO. Expert Committee on Hypertension Control¸ Geneva¸ p.24-31¸ oct. 1994.

WILSON¸ T.; TEMPLE¸ N. J. Nutritional Health – Strategies for disease prevention. New Jersey: Humana Press¸ 2001.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...
Related Posts with Thumbnails