"Existe claramente uma polarização dogmática no uso de gelo na comunidade fisioterapeutica/atlética! Velhos hábitos custam a ser quebrados. Muitos colegas ainda insistem em usar gelo... apesar da evidência científica disponível atualmente"
Em 2013 os investigadores da NATA apresentam as suas conclusões sobre a intervenção na entorse da tibiotársica, após anos de discussão crítica. A evidência reunida por estes vai desde o nível de evidência "A" ao "C", sendo que posição geral foi de um nível de evidência C (Kaminski et al., 2013). O artigo afirma "Existe forte evidencia clínica que a administração crioterapia é limitada". A evidencia mostrou que as intervenções com melhores resultados seriam; reabilitação funcional, propriocepção, equilíbrio e mobilização.
Qual o efeito do gelo na lesão?
O gelo tem sido usado como tratamento padrão para lesões e recuperação da dor muscular uma vez que ajuda a aliviar a dor do tecido lesionado. A prática do RICE tem sido usada há décadas, no entanto parece que o Ice e o Rest podem atrasar o processo de recuperação, em vez de o acelerarem. Num estudo recente, os atletas exercitaram numa intensidade que provocasse dano muscular severo, de forma a que causasse dor muscular prolongada. Apesar do gelo atrasar a tumefacção, não acelerou o processo de recuperação muscular (The American Journal of Sports Medicine, June 2013). Um estudo de revisão de 22 artigos científicos encontrou que não existem quase nenhuma evidência que o gelo e a compressão acelerassem o processo de recuperação quando comparado com apenas compressão, apesar de o gelo adicionado ao exercício poderá marginalmente ajudar a recuperação de entorses no tornozelo (The American Journal of Sports Medicine, January, 2004;32(1):251-261).
A recuperação necessita da inflamação
Quando a lesão tecidular através de trauma ou de desenvolvimento de dor muscular por exercício intensivo, a recuperação ocorre através de um processo imunitário, que utiliza os mesmo mecanismos biológicos que usam para matar germes, chamado de inflamação. Quando os germes entram no corpo, o sistema imunitário envia células e proteínas para a área infectada para destruir estes germes. Quando os músculos e outros tecidos são danificados, o sistema imunitário envia as mesmas células inflamatórias para o tecido lesionado para promover a recuperação. A resposta tanto à inflamação como à lesão tecidular é a mesma (Journal of American Academy of Orthopedic Surgeons, Vol 7, No 5, 1999).
O gelo impede a entrada das células necessárias para a recuperação no tecido lesionado
Aplicar gelo no tecido lesionado provoca uma constrição no vasos sanguíneos circundantes e quebra com o aporte sanguíneo que leva as células necessárias para a recuperação da inflamação (Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc, published online Feb 23, 2014). Estes vasos sanguíneos parecem não reabrir por algumas horas após a aplicação do gelo. Esta diminuição do aporte sanguíneo pode causar morte tecidular por falta de aporte sanguíneo e pode, até mesmo, causar lesões nervosas permanentes.
Tudo o que reduz a inflamação também atrasa a recuperação
Qualquer tratamento que reduza a inflamação, também irá atrasar a reposta imunitária e, por conseguinte, a recuperação muscular. Assim, a recuperação poderá ser atrasada por:
- medicação cortiscosteroide,
- anti-inflamatórios não-esteroides, por exemplo, ibuprofeno (Pharmaceuticals, 2010;3(5)),
- supressores imunitários, muitas vezes usados para tratar a artrite, cancro e psoríase,
- aplicação de gelo,
- qualquer coisa que diminuia a resposta inflamatória.
O gelo também diminui a força, velocidade, resistência e coordenação
O gelo é muitas vezes usado como tratamento a curto prazo para ajudar o atleta a retomar o jogo. Este arrefecimento pode ajudar a diminuir a dor, no entanto interfere com a força, velocidade, resistência e coordenação do atleta (Sports Med, Nov 28, 2011). Nesta revisão, foram incluidos 35 estudos sobre os efeitos da aplicação do gelo, em que a maioria efectuava uma aplicação de 20 minutos e reportaram que imediatamente à aplicação, ocorria uma diminuição da força, velocidade, potência e agilidade durante a corrida. Os autores recomendam que quando se utilizar o gelo para limitar a tumefacção, deve ser aplicado apenas 5 minutos, seguidos de uma aquecimento prévio ao retorno ao jogo.
Gabe Mirkin recomenda que as pessoas que estejam lesadas parem imediatamente de fazer exercício. Se a dor é severa, se estão incapazes de se mover ou se estão desorientados ou que tenham mesmo perdas de consciência, devem ser vistos de emergência por um médico. Se possível, deve-se elevar o membro lesado para utilizar a gravidade para ajudar a minimizar a tumefacção. Se a lesão for muscular, a aplicação de uma banda de compressão poderá ajudar. Uma vez que aplicar gelo numa lesão reduz a dor, é aceitável utiliza-lo na região lesada por curtos períodos de tem imediatamente após a lesão. Poderá ser aplicado o gelo até um máximo de 10 minutos, retira-lo por 20 minutos e repetir a aplicação de 10 minutos, uma a duas vezes. Não há motivo para aplicar gelo mais de 6 horas após a lesão.
Renato Andrade
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